BRASÍLIA – O deputado cassado
Eduardo Cunha (PMDB-RJ) acusou o secretário do Programa de Parcerias de
Investimentos, Moreira Franco, homem forte do governo Michel Temer, de estar
por trás de irregularidades na operação para financiar obras do Porto Maravilha,
no Rio.
Ao classificar Moreira como “o
cérebro” da gestão Temer, Cunha disse que o novo plano de concessões “nasce sob
suspeição” e deu sinais de que pode atingir o presidente.
“Na hora em que as investigações
avançarem, vai ficar muito difícil a permanência do Moreira no governo”,
afirmou, na primeira entrevista exclusiva após perder o mandato.
Ex-presidente da Câmara, Cunha é
suspeito de ter cobrado da empreiteira Carioca Engenharia R$ 52 milhões de
propina em troca da liberação de verbas do Fundo de Investimento do FGTS
(FI-FGTS) para o Porto Maravilha, projeto de revitalização da região portuária.
Ele chama a denúncia de “surreal” e aponta o dedo para Moreira.
Cunha também criticou Temer, por
“aderir ao programa de quem perdeu a eleição”.
E prometeu revelar bastidores do
processo de impeachment de Dilma Rousseff em livro que lançará no fim do ano.
“Vai ser um presente de Natal”.
O governo avalia que a denúncia da
Lava Jato contra o ex-presidente Lula enfraquece as manifestações “Fora,
Temer”. O sr. concorda?
Tudo depende do que está motivando
a sociedade para o “Fora, Temer”. Mas temos um problema: o Michel foi eleito
com a Dilma com um programa que ela não cumpriu. E ele também não está
cumprindo. Por outro lado, ele aderiu ao programa do PSDB e do DEM, que
perderam a eleição. Que o Brasil precisa de reforma previdenciária,
trabalhista, não tenho dúvida. Mas é difícil fazer uma coisa muito radical, no
meio de um mandato, com alguém sem a legitimidade de estar discutindo isso
debaixo de um processo eleitoral.
O sr. acha que o presidente Temer não tem legitimidade?
Ele tem legitimidade. Eu disse que
talvez não tenha para um programa radical, contrário àquilo que foi colocado no
processo eleitoral. A população aplaudiu porque tirou a Dilma, mas não está
satisfeita.
O sr. está dizendo que não queriam Dilma, mas também não querem Temer…
Não querem porque não se sentem
representados. Me preocupa um jovem virar para mim na rua, me cumprimentar e
dizer: “Parabéns, a gente queria tirar essa mulher, queria tirar o PT, mas não
tem por que entubar esse vice”.
E o que ele deve fazer?
Acho que tem de ser uma coisa mais
light, tentando recuperar aquilo que a Dilma descumpriu, sem movimentos
radicais. Uma vez o próprio Michel disse o seguinte: “A presidente não vai
conseguir se aguentar com esses índices de popularidade”. Só que ele está (em
situação) semelhante. Dilma precisava recuperar popularidade. Ele precisa
ganhar, porque não tem. O Michel tem de tomar cuidado porque, no fundo, o PSDB
quer jogar a impopularidade no colo dele para depois nadar de braçada. Mas quem
manda no governo é o Moreira Franco.
Por que o sr. chamou Moreira Franco
de eminência parda?
Ele é muito mais do que eminência
parda. Moreira Franco, que se diz sociólogo, é o cérebro do governo. Foi ele
que articulou a candidatura do genro, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para ser
presidente da Câmara, atropelando a base aliada.
Dilma dizia que o sr. era quem
mandava no governo interino.
Fica claro hoje que não era. O
Moreira Franco era vice-presidente (de Fundos e Loterias) da Caixa, antes do
Fábio Cleto, que fez a delação falando de mim. Quem criou o FI-FGTS na Caixa
foi o Moreira Franco. Toda a operação no Porto Maravilha foi montada por ele.
No programa de privatização, dos R$ 30 bilhões anunciados, R$ 12 bilhões vêm de
onde? Do Fundo de Investimento da Caixa. Ele sabe de onde tirar dinheiro. Esse
programa de privatização começa com risco de escândalo. Nasce sob suspeição.
Delatores dizem que o sr. recebeu
propina na obra do Porto Maravilha. E Fábio Cleto era ligado ao sr., seu
braço-direito na Caixa.
Fábio Cleto era ligado à bancada do
PMDB e eu desminto qualquer recebimento de vantagem indevida. Acho engraçado
quando você pega e fala de delação, citando Porto Maravilha, quando quem
conduziu toda a negociação e abertura de financiamento, em conjunto com o
prefeito do Rio (Eduardo Paes), foi o Moreira. E agora aparece uma denúncia e é
contra mim? Isso é surreal. Quem comandava e ainda comanda o FI (Fundo de
Investimento) chama-se Moreira Franco. E lá tem muitos financiamentos
concedidos que foram perdas da Caixa. Na hora em que as investigações
avançarem, vai ficar muito difícil a permanência do Moreira no governo.
De que perdas o sr. fala?
Uma de que me lembro foi da Rede
Energia. Outra foi da Nova Cibe. O uso de energia, na época, teve escândalo
grande.
O sr. tem provas em relação a
Moreira Franco?
Estou levantando suspeição, em
minha defesa, por uma razão muito simples. Há um inquérito instaurado com uma
delação do Fábio Cleto em cima de uma operação que foi feita quando Moreira era
vice-presidente da Caixa.
O ministro do Supremo Tribunal
Federal Teori Zavascki, relator da Lava Jato, autorizou a remessa para a
Justiça Federal do Paraná da ação em que o sr. é acusado de corrupção por
manter contas na Suíça para recebimento de propina da Petrobrás.
O sr. tem medo
de ser preso?
Medo? Nenhum. Não há provas contra
mim. Só se for uma motivação de natureza política. Não se pediu prisão na
denúncia apresentada contra o Lula. Por que fariam em relação a mim?
O Ministério Público diz que Lula é
o “comandante máximo” da corrupção na Petrobrás, mas o sr. também foi acusado
de ser chefe do esquema de propina…
Eu não sei se ele é ou não o
comandante máximo, mas o que sempre me deixou estarrecido foi quererem me
carimbar como se eu fosse o chefe do esquema. Isso é ridículo. Naquele período
de 2006, até 2007, eu estava no grupo do vagabundo daquele (Anthony) Garotinho,
numa linha contra o Lula.
O sr. está escrevendo um livro
sobre os bastidores do impeachment. Vai revelar conversas comprometedoras?
Não sei se são comprometedoras. Vou
contar as reuniões, os diálogos, tudo, doa a quem doer. A conclusão será de quem
lê. Quero lançar no fim do ano. Vai ser um presente de Natal.
O sr. sempre foi amigo de Temer,
mas agora tem feito ameaças. Auxiliares dele dizem que são bravatas…
Estou ameaçando quem? O
distanciamento que existe é porque eu quero. Houve muita hipocrisia. Não há
razão para eu manter convivência com um governo que me cassou.
Na sua avaliação, o presidente
termina o mandato?
Espero que termine. Desejo sucesso
a ele, mas vejo muita dificuldade. Há ainda o risco do julgamento no Tribunal
Superior Eleitoral, que pode cassar a chapa. Se levar a julgamento, vai cassar.
As provas são irrefutáveis. Pergunto: por que o PSDB não desistiu da ação? Para
deixar uma faca no pescoço.
Então o sr. avalia que o PSDB teria
de deixar o governo?
Não acho que tenha de colocar o
PSDB e o DEM para fora, mas esses dois partidos não podem querer tomar conta do
governo na mão grande. É isso que solidifica o discurso do golpe. O País ainda
não entrou numa estabilidade política.
E vai entrar?
Acho que vamos nessa situação de
empurrar com a barriga até a eleição de 2018.
O que o sr. não faria novamente, se
pudesse voltar atrás?
Talvez eu devesse ter sido mais
Renan (Calheiros, presidente do Senado) e menos Eduardo Cunha. Renan é jogador,
é falso, é dissimulado. Eu meço menos o que vou fazer. Outro erro do qual me
arrependo foi ter anunciado o rompimento com o governo Dilma. Eu deveria ter
rompido na prática, mas não no verbo.
O sr. vai sair do PMDB?
Por que vou sair do PMDB? Minha
guerra não está perdida. Ainda está só começando.
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